terça-feira, 15 de outubro de 2013

“La belle et la bête féroce”

“La belle et la bête féroce”

     A bela e a fera em mais de uma tradução. A bela e a fera aquém de uma ficção. A bela e a fera numa mesma equação distanciada da igualdade. A bela desprotegida, a fera ferocidade. A bela adormecida, a fera acordada. A bela atacada, a fera armada. A bela ferida, a fera enfezada. A bela assassinada, a fera fugitiva. A bela sepultada, a fera mais do que viva.
     A bela na casa de ferreiro, a fera no fim da picada. A bela despetalada, a fera brutalizada. A bela abusada, a fera fornicação. A bela violada, a fera submissão. A bela esfaqueada, a fera covardia em ação. A bela ensangüentada, a fera com a faca na mão. A bela despida, a fera longe da prisão. A bela sem primavera, a fera em continuado verão. A bela mulher brasileira diante da mesma dor, a fera masculina enquadrada como simples agressor.
    Cabaré francês repaginado de uma mesma clientela. Capitulo interminável de novela. Reprise e seriado. Fim de noite. Feriado. Crime anunciado. Ocorrência policial. Manchete de jornal. Circunstância sexual. Morena, alta, sensual. Carro importado, etc. e tal. Preço promocional. Programa marcado. Motel escolhido. Pagamento efetuado. Tiro disparado. Corpo abatido. Corpo tombado. Corpo assassinado. Corpo em putrefação.
     Não só a prostituta é a bela vitimada em cada madrugada. Não só a dona do lar é a bela de uma família desajustada. Nem só a Maria é destratada. Nem só a Maria é abusada sexualmente. Nem só a Maria é dominada pelo valente. Nem só a Maria perdeu mais de um dente. Mais de uma Maria levou mais do que um safanão. Mais de uma Maria vive no mesmo mundo cão. Mais de uma Maria foi eleitora numa mesma eleição. Mais de uma Maria permanece sem representação.
      Quem foi com as outras e nunca mais voltou? Quem dormiu de toca e nunca mais acordou? Quem escreve, imagina. Quem lê, raciocina. E quem mata? E quem morre? E quem salva? E quem socorre? Quem correu? Quem ficou? Quem bradou? Quem se calou? Franceses? D’où venez-vous?
Airton Reis, professor, poeta e embaixador da paz em Mato Grosso. airtonreis.poeta@gmail.com


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