quarta-feira, 23 de julho de 2014

Quarto, sala e sacada

Quarto, sala e sacada
       Quarto de solteiro. Sala de estar. Sacada para avistar. Quarto sem ventilação. Sala de televisão. Sacada gradeada. Quarto sem banheiro. Sala picadeiro. Sacada do povo brasileiro. Beliche, poltrona e banco de madeira reciclada. Travesseiro sem fronha, almofada francesa, rede lavrada. Alvorada sem fogos e sem rojões. Taça amarga. Vitória dos campeões. Selecionados pela mesma bola. Rosas na cartola. Concentrados pelo mesmo ideal. Motivados pela Copa Mundial. Cravos nas chuteiras. Tulipas e rasteiras. Moinhos de um mesmo vento. Torcidas e bandeiras. Bandeiradas e apito final. Placar largo. Vantagem maioral.
       Tática e técnica. Campos gramados. Times consagrados. Goleadores e goleadas. Bolas divididas. Bolas disputadas. Bolas certeiras. Bolas estrangeiras. Bolas cavadas na toca do mesmo tatu. Bolas encaroçadas em angu. Bolas de caviar. Bolas de sagu. Bolas de sabão. Bolas de uma seleção. Bolas murchas. Bolas minguadas. Bolas lamentadas. Bolas travadas. Bolas motivadas. Bolas vaiadas.
        Lesionados com sofreguidão. Suspensos pelo mesmo cartão. Vencidos e ultrapassados em bis e refrão. Envaidecidos pelo mesmo espetáculo intercontinental. Envergonhados em mais de uma tentativa experimental. Hora da reciclagem em tempo real. Minuto do silêncio sepulcral. Segundo do torcedor nacional. Realidade sem qualquer ficção. Quarto lugar. Sala ou salão? Sacada ou saco de pancada? Epitáfio da Seleção.
         “Aqui jaz um campeonato sepultado em eterna dormência. Aqui jaz o retrato da incompetência. Aqui jaz a falência da bola no pé contundido. Aqui jaz um time preterido. Aqui jaz uma esperança sepultada. Aqui jaz uma verdade compartilhada. Aqui jaz uma vaidade vencida. Aqui jaz uma probabilidade distorcida. Aqui jaz uma derrota anunciada. Aqui jaz uma pretensão da Pátria Amada”.
           Perdemos de goleada? Sim ou não? Ganhamos mais do que uma Arena edificada? Talvez ou certamente? E com que cara nós ficaremos, os torcedores de antanho? E com que argumentos nós justificaremos esse “banho”? Doravante, mais do que a cara lavada. Doravante, mais do que uma goiabada sem queijo. Doravante, siri na enseada. Doravante, o mangue sem caranguejo.
           Terceiro tempo de uma mesma prorrogação. Tempo da despedida de uma Seleção verde e amarela. Quem beijou, beijou. Quem marcou, ganhou. Quem apostou, perdeu. Quem torceu, decepcionou. Quem acreditou, assistiu e não aprovou. Quem goleou, venceu e levou. Sonho de Hexa Campeão adiado. Quem sabe até em 2018, lá na Rússia, aprendamos com quantos jogadores obteremos um melhor resultado. Por hora, o placar inalterado. Quarto lugar, quarteto em nada violado...
          Tempo esgotado. Viva a Alemanha! Viva Argentina! Viva a Holanda! Viva o Povo brasileiro, cortes e hospitaleiro. Viva o quarto apertado em mais de uma mazela. Viva a sala de espera. Viva a sacada da Pátria Brasil em brado retumbante sonorizado e estampado numa mesma aquarela. Ende! Fin! Einde! Fim!
Airton Reis, professor e poeta em Cuiabá-MT.

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